quarta-feira, 18 de julho de 2007

Calçada de Carriche

Luísa sobe, sobe a calçada,
sobe e não pode que vai cansada.

Sobe, Luísa, Luísa, sobe,
sobe que sobe sobe a calçada.

Saiu de casa
de madrugada;
regressa a casa
é já noite fechada.
Na mão grosseira,
de pele queimada,
leva a lancheira
desengonçada.

Anda, Luísa, Luísa, sobe,
sobe que sobe, sobe a calçada.

Luísa é nova,
desenxovalhada,
tem perna gorda,
bem torneada.
Ferve-lhe o sangue
de afogueada;
saltam-lhe os peitos
na caminhada.

Anda, Luísa. Luísa, sobe,
sobe que sobe, sobe a calçada.

Passam magalas,
rapaziada,
palpam-lhe as coxas
não dá por nada.

Anda, Luísa, Luísa, sobe,
sobe que sobe, sobe a calçada.

Chegou a casa
não disse nada.
Pegou na filha,
deu-lhe a mamada;
bebeu a sopa
numa golada;
lavou a loiça,
varreu a escada;
deu jeito à casa
desarranjada;
coseu a roupa
já remendada;
despiu-se à pressa,
desinteressada;
caiu na cama
de uma assentada;
chegou o homem,
viu-a deitada;
serviu-se dela,
não deu por nada.

Anda, Luísa. Luísa, sobe,
sobe que sobe, sobe a calçada.

Na manhã débil,
sem alvorada,
salta da cama,
desembestada;
puxa da filha,
dá-lhe a mamada;
veste-se à pressa,
desengonçada;
anda, ciranda,
desaustinada;
range o soalho
a cada passada,
salta para a rua,
corre açodada,
galga o passeio,
desce o passeio,
desce a calçada,
chega à oficina
à hora marcada,
puxa que puxa, larga que larga,[x 4]
toca a sineta
na hora aprazada,
corre à cantina,
volta à toada,
puxa que puxa, larga que larga,[x 4]

Regressa a casa
é já noite fechada.
Luísa arqueja
pela calçada.

Anda, Luísa, Luísa, sobe,
sobe que sobe, sobe a calçada, [x 3]

Anda, Luísa, Luísa, sobe,
sobe que sobe, sobe a calçada.

by António Gedeão

Esta poema é espetacular, ouvi declamarem-no na apresentação da Academia Cultural de Benfica no Teatro Maria Vitória no passado dia 1 de Julho, enquanto estavamos todos atrás do palco à espera do final (a Caroline é que viu a declamarem-no, perferiu ver em vez de participar, não é? estou a brincar contigo :) ) e realmente foi extraordinário, o único que valeu a pena dos que os alunos do curso de formação de actores apresentaram, esse e a Pedra Filosofal. Claro que não tem a mesma intensidade lê-lo do que teria se o ouvissem declamar, mas espero que gostem na mesma!
*****
Morgaine

2 comentários:

Anónimo disse...

Pois é...realmente adorei quando a rapariga declamou este poema e para mim foi sem sombra de dúvidas o melhor, apesar de a primeira rapariga a actuar também ter feito muito bem o papel!!
Não estava atrás do palco por causa dos exames e também devido a um pouco de preguiça que acho que todos temos (é que nem toda a gente vive a 5 minutos da junta =))
Para além da vossa apresentação de hip hop adorei mesmo ver o sapateado irlandês (tinha de ser, não é?)!
Agora finalmente de férias parece que este blog está a andar para a frente!

bjns****

Anónimo disse...

Bem, como a Caroline pediu para vir cá comentar o blog achei por bem fazê-lo no post mais recente=P
Também tive o previlégio (ou não) de ouvir este poema a ser declamado e digo-vos muito sinceramente que não gostei nem um bocadinho. Peço imensa desculpa, Caroline e Morgaine, mas achei mesmo que a mulher estava a ter um ataque, e dos fortes.Uma coisa é sentir o que se declama outra completamente diferente é dizer tudo como se fossem as últimas palavras. À parte disso, diverti-me imenso nesse dia a actuar, que para mim foi uma experiência completamente nova.
Agora já não há mesmo desculpas para não haver mais comments visto que estamos de FÉrIAs!!!finalmente!
Muitos beijinhos e espero que continuem a fazer juz à bela literatura portuguesa;)